quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

SALVO PELA TEIA

Conta uma velha lenda que, no inferno, gemia e penava a alma de um ladrão. Clamava sempre pelo céu. Parecia-lhe impossível, porém, conseguir a mudança.


Desanimava-se, quando lhe apareceu um anjo celestial e perguntou-lhe se se lembrava de algum bem que houvesse feito enquanto vivera na terra. Não, não se lembrava. Fora ladrão, egoísta, cuidara apenas de si. Nada fizera em favor de outros. Foi então que o anjo lhe disse que, certa vez, quando ele, ladrão, descansava à beira de uma estrada, vira uma aranha que ia ser pisada pelos que passavam e dali a tirara. Esse ato bom fora registrado e seria aquela aranha que o salvaria. Mostrou-lhe o anjo um fio de teia de aranha que do céu descia até o inferno. O fio lhe pertencia, por ele subisse ao céu.


Começou a escalada. Ia contente. Enfim, seu sonho se tornaria realidade. Logo mais, livre do inferno, estaria no céu.


De repente, lá em baixo a ponta do fio oscilou violentamente. Olhou e viu, alarmado, inúmeras almas que subiam pelo fio acima. Não se conteve e protestou:


— Larguem do fio! Ele é só meu! Fui eu quem salvou a aranha! Larguem!


Nervoso, irritado, sacudia o fio para que os outros caíssem. Aconteceu o inesperado: partiu-se o fio e o ladrão caiu de novo no inferno. Levantou-se a protestar. O anjo se aproximou e lhe disse:


— Tu não te acostumarias no céu. És muito egoísta. O céu é o reino do amor. Não te darias com o seu clima.

Será que nos acostumaremos com o céu? Nossa mudança para ali será realmente agradável? Se não vivemos a vida de amor dificilmente nos aclimataremos.



(Extraído de VASSÃO, Amantino Adorno. Esteiras de Luz. Rio de Janeiro: Juerp, 1971.)

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