sábado, 8 de fevereiro de 2020

PROFESSOR ATEU EVOLUCIONISTA E ALUNO CRIACIONISTA

Anos atrás, quando eu ainda estava fazendo o curso de Ciências Biológicas na UFRGS, enfrentei o desafio que me pareceu o mais difícil de todo o curso. Estava cursando a disciplina de Evolução. Eu e outra colega éramos as únicas criacionistas na turma e, às vezes, saíamos bastante desanimadas das aulas. O professor apresentava muitas “evidências” da evolução em cada aula. Os argumentos eram bem construídos e ele apresentava argumentos criacionistas e os desmantelava em cada aula. Os argumentos criacionistas que ele apresentava para desmantelar pareciam frágeis e ridículos. Algumas vezes saíamos perplexas das aulas! Ele fazia provas do tipo argumentativo. Colocava algumas questões sobre o que era dito por criacionistas e tínhamos que responder às questões. O problema é que aqueles argumentos criacionistas não eram realmente bons e eu não podia defendê-los.

As pessoas nas igrejas achavam que era muito fácil desarmar os argumentos evolucionistas e não se davam ao trabalho de estudar o que era ensinado na universidade; acabavam combatendo a visão popular do que é a evolução. E era essa a visão que minha colega e eu tínhamos quando chegamos, totalmente despreparadas, ao nosso primeiro contato com a teoria da evolução ensinada nos meios acadêmicos.

Um dia cheguei em casa e comecei a falar com o Eduardo, meu marido, sobre o assunto, e resolvemos estudar teoria da evolução em mais profundidade. Eu precisava saber mais do que os meus colegas e, se possível, mais do que meu professor.

O professor fazia três tipos de avaliação da turma: uma prova escrita de cada área, um seminário feito em grupo em que era escolhido um dentre os assuntos propostos por ele e uma espécie de resenha de algum artigo ou capítulo de livro. A resenha era a última tarefa a ser entregue antes do fim do semestre e eu escolhi a introdução do livro texto que ele recomendou para a turma e para o qual ele tinha conseguido um preço especial, de tal forma que toda a turma o comprou, inclusive minha colega e eu.

Escolhi a introdução do livro porque ela dava uma visão panorâmica de tudo o que o livro ensinava sobre evolução. Rebati cuidadosamente um a um dos argumentos apresentados no capítulo, verificando o que cada capítulo que tratava do assunto aprofundava. Para essa tarefa, pedi conselhos para o meu marido sobre alguns assuntos.

O resultado é que nesse trabalho acabou até aparecendo uma fórmula da ação mínima, que o Eduardo forneceu para mim. Tudo isso aconteceu muito antes de o Eduardo realizar sua primeira palestra criacionista para a Sociedade Criacionista Brasileira.

No último dia de aula, quando eu estava saindo da sala, o professor se aproximou para conversar comigo. Ele me perguntou se eu tinha feito o curso de Física. Respondi que meu marido era físico. Ele parecia desconfortável e incomodado, mas ao mesmo tempo havia uma enorme curiosidade nos olhos dele.

Depois disso, cada vez que passava por ele nos corredores do Instituto de Biociências, ele me cumprimentava de um modo simpático.

Alguns semestres depois, minha cunhada, que também fez o curso de Ciências Biológicas na UFRGS, estava cursando a disciplina de Evolução. Naquele semestre, ele colocou o tema “Ciência vs. Religião” para ser escolhido entre os temas a serem apresentados em seminário pelos grupos. O grupo da minha cunhada escolheu esse tema.

Ela me disse que em certa aula uma aluna perguntou ao professor se ele acreditava em Deus. A resposta dele foi mais ou menos assim: “Bem, eu não acreditava, mas agora já não tenho tanta certeza. Tive uma aluna que entendia de evolução, ela respondia muito bem às questões da prova, mas não acreditava em nada daquilo, e ela me fez pensar.”

Essa experiência me fez perceber que não sabemos nada do que vai no coração humano. Quem pode saber quem está além das esperanças? Um professor ateu convicto que trabalha para destruir as convicções religiosas dos alunos?

(Maria da Graça Friedrich Lütz, bióloga e bioquímica)

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